Mercado ou Centro Comercial?

MERCADO TRADICIONAL OU CENTRO COMERCIAL?

É preciso refletir sobre o que poderá ser o melhor serviço a prestar aos munícipes no que se refere à ocupação daquele magnífico edifício classificado e à sua preservação como monumento municipal de grande valor cultural. Nos seus últimos tempos de atividade ainda acolhia alguns pequenos comerciantes e lojistas que foram sobrevivendo ao desgaste populacional do centro histórico e resistindo ao tratamento desrespeitoso de executivos camarários sem planos nem medidas que mitigassem esse abandono. 

À parte a sua pouca atratividade comercial tinha e continua a ter, um enorme interesse histórico e arquitetónico, como projeto do arquiteto Cassiano Branco e repositório de um grande conjunto de painéis de azulejos, testemunhos de uma cultura popular miserabilista e de uma ditadura que evidenciava as virtudes da humildade e da pobreza. Note-se que esses painéis foram colocados dois anos após a conclusão do edifício.

 

Recentemente iniciaram-se as obras sobre um projeto que parece privilegiar a sua ocupação futura com as ofertas que se podem encontrar nos centros comerciais modernos, onde também coabitarão algumas bancadas com hortícolas e frescos, a que os comerciantes locais se podem candidatar, não havendo, nesse concurso, qualquer discriminação positiva para quem passou grande parte da sua vida dentro daquele espaço, ficando com muito poucas possibilidades de lá continuarem.-

 O que se tem ouvido e lido, indicia uma gestão do espaço por uma empresa nacional (gestora de grandes superfícies comerciais), certamente insensível às necessidades prioritárias dos munícipes e que, na sua legítima ótica da rentabilidade, procurará que o espaço seja ocupado com ofertas já habituais nas grandes superfícies comerciais e com pouco a ver com o que tem sido tradicional naquele mercado. A restauração ocupará a quase totalidade do espaço, antevendo-se a proliferação das ofertas de fast food e de soluções gastronómicas nada tradicionais. Será uma boa solução? Sem soluções alternativas de parqueamento automóvel, parece-me que não.

Discordando do método e do modo previstos para esse tipo de ocupação, penso no entanto que poderia ser uma boa ocasião para se rever todo um processo concentrado de distribuição dos produtos tradicionalmente oferecidos no nosso mercado.

 

PORQUE NÃO DOIS MERCADOS?

 

Santarém é, atualmente, uma cidade polinuclear em que o seu tradicional centro histórico se encontra praticamente vazio de moradores. Os maiores centros habitacionais estão localizados em pontos opostos, distando várias centenas de metros e até alguns quilómetros, do atual mercado. Não existe assim, qualquer possibilidade de lá se deslocarem os moradores do Sacapeito ou de S. Domingos, a não ser utilizando o automóvel ou o transporte público. Sabemos que, nestas zonas, vai crescendo o número de idosos e de pessoas com mobilidade dificultada que ficariam com a sua vida facilitada se tivessem perto de si as ofertas que um mercado tradicional encerra.   

 

 A CMS, como gestora da coisa pública e zeladora do bem-estar dos seus munícipes, poderia pensar em assegurar aos scalabitanos alternativas de consumo de proximidade com a criação de mercados mais pequenos (por exemplo, um em S. Domingos e outro no Sacapeito/Campo Emílio Infante da Câmara), essenciais para o escoamento de muitos artigos produzidos nas freguesias do Concelho e facilitadores da acessibilidade de uma população tendencialmente mais envelhecida e de mobilidade condicionada. 

Será difícil prever que a continuação do mesmo tipo de oferta no futuro mercado, tenha viabilidade económica. Existem mais alternativas com estacionamento gratuito e com oferta mais diversificada;

 

Os atuais comerciantes, muito dificilmente obterão espaços no mercado remodelado, e os que o conseguirem irão certamente ter um futuro sem viabilidade e um destino igual ao dos outros que, até há uns anos atrás enchiam as bancas com peixe do rio e com as frutas e hortícolas produzidas pelos pequenos agricultores do concelho.

A solução será a implantação de mercados de proximidade? Penso que essa seria uma boa alternativa, mas não há nada como estudar a sua viabilidade, consultar quem pode ter uma opinião abalizada sobre o tema e, porque não, promover um debate aberto sobre o assunto.

Antes de tudo, é preciso haver vontade política para inovar racionalmente e colocar na frente os interesses dos munícipes.

 

Setembro de 2019 

 

Armando Leal Rosa